Zeus e Mnemosine: as Musas
na Teogonia de Hesíodo

A Religião Pagã fala da realidade dos Deuses

Claudio Simeoni
traduzido por Dante Lioi Filho

De: CLAUDIO SIMEONI em seu LIVRO: * A ESTIRPE DOS TITÃS *

A Religião Pagã e a Teogonia de Hesíodo

 

Mnemosine e as Musas

Mnemósine é um Titã, uma Titânide, de quem a ação, no mundo do tempo, se difunde ligando entre eles as ações que, naquele mundo manifestam-se em um presente perene, que adiciona ações às ações, e que modificam ações, com um processo de adaptação subjetiva em que as ações resultantes são objetos que modificam aquele mundo. Na ação/objeto está contida a memória do intento, das condições e da necessidade pelos quais aquela ação se manifesta como objeto. No mundo do tempo a ação/objeto se conclui em si mesma contendo as condições, o intento e a necessidade que a substanciam.

Na Teogonia Mnemósine intervém somente na construção do mundo racional de Zeus. Não tem nenhum papel, nenhum filho, porquê Mnemósine é ação que une as ações em um conjunto que constitui a ação que, se faz memória do complexo do mundo do tempo, onde manifesta a sua substância.

No mundo racional a ação não é um objeto, mas é manifestação de um objeto descrito e definido. No mundo da forma e da descrição, a ação não tem memória do agir, mas a memória do agir pertence ao objeto que age no mundo racional que assume o nome de "sujeito". No mundo do tempo a ação é consciência dela mesma, nela mesma; no mundo da razão a consciência é do sujeito que age.

Neste âmbito, a ação que se manifesta necessita de um "porquê". Não é importante se na realidade o "porquê" não explique a ação, o importante é que o "porquê" justifique a ação à consciência do sujeito. Seja do sujeito que age, ou do sujeito que é envolvido na ação, seja no sujeito como na ação que a ele pertence.

Disto a necessidade de recordar-se de fragmentos do passado em que a ação do sujeito se insere procurando definir o significado que a ação tem no mundo racional, e as consequências que tal ação produz obrigando os sujeito do mundo a se adaptarem a ela.

Seja quando a ação tenha uma justificação racional, pensada pelo sujeito que age, seja quando a ação tenha uma justificação instintiva (sempre é uma justificação instintiva, mas a razão aprecia muito pensar que é ela que incita o sujeito à ação) tem início em uma memória que se transformou em substância emotiva de um sujeito que vive. A substância emotiva, o corpo emotivo, de cada sujeito vivente, é sedimentação da experiência transformada em emoção, que responde às emoções do mundo, além, isto é, independentemente de como as emoções se apresentem. Em outras palavras, é Mnemósine que constrói uma ponte no sujeito da natureza entre o agir dele, como sujeito no mundo, e a memória que se transforma em sedimentação emotiva construindo o corpo luminoso de experiência em experiência.

Tentemos recordar das Titânides, o Poder de Ser que elas representam, e que chamam, do Tártaro, os Seres que germinaram em Hera para que tomem em suas próprias mãos o vir a ser próprio.

A primeira, a ser nomeada por Hesíodo, é Teia: a luz como Discernimento de si mesma; a Consciência que se torna consciente de si mesma.

A segunda nomeada por Hesíodo é Rea: o Ser Terra em si.

A terceira nomeada por ele é Temis: a Justiça, o equilíbrio nas relações.

A quarta nomeada por Hesíodo é Mnemósine: a memória, o recordar e o que veremos agora.

A quinta nomeada por Hesíodo é Foibe (ou Febe) a luz da Consciência e do Conhecimento que se transforma em Seres.

A sexta, indicada por Hesíodo, é Tétis: a avó, a antepassada primogênita da qual germinam as formas de vida como propósito de Hera; de cada Hera.

Passando através de Zeus, do mundo do tempo ao mundo da razão, como uma manifestação do sujeitos, Mnemósine é a memória que os Seres, filhos de Hera, deverão usar na existência deles para enfrentarem as suas oposições.

Mnemósine é o conhecer mais as coisas, através das quais o sujeito toma as decisões nas quais exercita a vontade própria. Exercitando a vontade própria o sujeito escolhe as adaptações melhores para construir a si mesmo. Ao fazer isto ele se transforma em um DEUS porquê é um sujeito que escolhe, e não somente um sujeito que sofre escolhas que não as dele.

Usarei uma imagem para que se possa compreender o que Zeus fez.

Admitamos existir um Ser Humano muito estudioso, muito sapiente. Um Ser Humano tal que conseguiu estudar tudo o que podemos imaginar, dentro da capacidade em estudar e aprender dos Seres Humanos, e que guardou dentro de si o que estudou. Por exemplo, um Pico della Mirandola. Pois bem, este homem, diante dos problemas, e das oposições da vida, pescará as soluções em tudo o que estudou. Enfrentará as contradições que se lhe apresentam com a cultura que ele acumulou. Resolverá os problemas pescando dentro de si as informações de que precisa. Este é o resultado da ação de Zeus. Esta é Mnemósine que age dentro dos Seres Humanos pela ação praticada por Zeus.

O Ser Humano, como espécie, escolheu acumular as informações que lhe servem para emitir um juízo, dentro dele. A razão do Ser Humano destacou-se assim da sua estrutura emotiva, que tendeu a ser independente da estrutura interior impulsiva emotiva. O Ser Humano raciocina ao invés de agir como resposta às solicitações do mundo.

O grande cérebro do Ser Humano é, somando-se tudo, um grande depósito de informações que tendem a serem desordenadas, caóticas, com frequência superabundantes acabando por levar a razão humana a delirar.

Este é o único modo para se usar Mnemósine na razão criada por Zeus? E como agem os insetos que não têm um cérebro no qual armazenarem informações?

Existe uma outra possibilidade no uso de Mnemósine por parte dos Seres da Natureza?

Pressuponhamos que todo o conhecimento, todo o saber do universo esteja escrito nos livros. Admitamos que esses livros estão guardados em uma biblioteca imensa com estantes em torno dos muros nos confins do universo e que, no centro dessa biblioteca, temos um Ser da Natureza ou, se preferirem, um Ser Humano. Esse Ser Humano não conhece o conteúdo de cada livro, isoladamente, porém do seu cérebro saem tantos filamentos de luzes que o conectam a cada um dos livros. Admitamos que esses filamentos são vermelhos. Quando esse Ser Humano encontra um problema referente a uma situação, a contradição encontrada, obriga os filamentos a passarem da cor vermelha à cor amarela ativando a conexão a um grupo de livros concernentes à contradição encontrada. A ativação dessas conexões fazem convergir aos centros de deliberação desse Ser Humano (digamos ao seu cérebro) todas aquelas informações contidas naqueles livros, e pertinentes aos argumentos da contradição que ele está vivendo. Este Ser Humano resolve a contradição do melhor modo e, uma vez superada a contradição, os filamentos voltam à cor vermelha desativando-se. No fundo, não funciona mais ou menos deste modo também o nosso cérebro mediante as conexões dos neurônios ou da rede das sinapses? Por qual motivo manter tudo dentro se o que se mantém dentro está também fora de nós?

Nesta ilustração de Mnemósine, a nossa espécie recortou um modo diferente para ter acesso às informações fixando-se na razão, que descreve o mundo, por intermédio das informações que ela armazenou. Mas não é somente um método para ter acesso às informações, pois quando as informações chegam por meio diferente, isto é construindo relações emotivas com os sujeitos do mundo, que se chama intuição, e é necessário pelo menos por um instante, obrigar a nossa razão ficar em silêncio. Cada um daqueles livros, de fato, é uma voz, uma Autoconsciência, uma representação de Mnemósine que se expande nos Seres filhos de Hera. São os ligamentos emotivos de cada Ser com cada Ser do Universo.

Zeus recorta uma ilha racional de conhecimento e descrição no mundo do tempo. Nesta ilha racional transfere as forças da vida, os Titãs, transformando a ação como objeto na ação, como manifestação do sujeito. Uma pequena ilha aonde construir o conhecimento e fazer nascer a noção de que os Seres germinados em Hera, usufruindo da bagagem que a própria espécie construiu para eles, possam utilizar como um terreno no qual construir os desafios específicos da existência. Os nascidos na Natureza podem ampliar os confins da ilha que habitam; devem amplia-los. Os germinados em Hera podem sair dessa ilha: podem sair e enfrentar o grande mar que circunda essa ilha.

É um mar estranho. Quando os Seres germinados em Hera o afrontam, então as suas mentes, o pensamento deles e o modo deles pensarem se ampliam, se iluminam, e a coragem invade-lhes todos os membros.

É o mar tranquilo do desconhecido. O desconhecido que pertence de qualquer modo à descrição da razão, e que a ciência explora mostrando-o descoberta após descoberta.

Quando, os que tiveram origem em Hera, obrigam a razão a ficar em silêncio, porque ela fica atônita com tantas possibilidades de conhecimento, que ela antes negava, os navegadores percebem que se encontram no misterioso mar do tempo. Nesse mar as ações se apresentam. Ações sem o tempo, mas que agem perenemente em um presente racional que procura modificar-se e adaptar-se.

Prosseguindo-se com a navegação encontra-se Oceano, mas este é um outro caso.

Em cada mar que os navegantes movem-se, há uma Mnemósine que espera. Um modo diferente de difundir Mnemósine que muda, anulando a memória em cada confim atravessado. Cada vez que se supera o limite entre o mundo racional e o mundo do tempo: uma Mnemósine termina e uma outra Mnemósine se apresenta. Uma Mnemósine que não sabe o que fazer com o tipo de memória usada pela Mnemósine do mundo anterior, que foi apenas deixado para trás. Assim, as recordações desaparecem e quem entra no mundo do tempo esquece da forma e da quantidade do mundo racional, e quem entra no mundo racional perde o sentido da ação, buscando, inutilmente, colocá-la em um tempo que nunca foi vivido.

É como se o rio Lete separasse os mundos nos quais o buscador de conhecimento e discernimento afunda: cada mundo, a própria memória e as próprias características com as quais tem vivido.

Hesíodo escreve na Teogonia traduzida por Romagnoli:

- Em seguida enamorou-se de Mnemósine de bela guedelha,
e dela nasceram as Musas das guirlandas douradas,
nove, que são agradáveis às festas e às alegrias do canto. -

Hesíodo, Teogonia 915 - 917

Através de Mnemósine, Zeus colocou as bases para que nos Seres, filhos de Hera, pudessem ser abertos os "canais de paixão" com os quais coligar à Mnemósine universal o Ser individual, atravessando o rio do esquecimento que separa os confins entre os mundos. Eu quis chamar esta criação de Zeus com o nome de "canais de paixão" porquê a paixão espargida na comunicação altera e detém o domínio da razão permitindo que o indivíduo se mova no mundo do tempo, e no mundo emotivo, retornando ao mundo da razão, consentindo que, com a disciplina individual, seja mantido um equilíbrio na percepção subjetiva do mundo com todos os três mundos.

Estes "canais de paixão" são as Autoconsciências que, geradas por Mnemósine e Zeus, quando exercitados pelo Ser da Natureza e pelo Ser Humano, que é o nosso caso, precipitam-se, através de uma avalanche emocional, nos limites que Zeus colocou para a salvaguarda da construção do Ser gerado em Hera. Estas Autoconsciências são as Musas!

Hesíodo elenca nove Musas, filhas de Zeus e de Mnemósine. Cada Musa é um "canal de paixão" capaz de conduzir o Ser Humano, que evoca-a, para além dos limites da razão. É um canal que pode levar o Ser Humano ao infinito ligando-o à Mnemósine que, filha de Urano Estrelado e Gaia, faz com que ressoem todas as vozes do infinito.

Para fazer isto, os nascidos em Hera, devem exercitar a autodisciplina e a impecabilidade nas suas ações partindo das suas urgências, dos seus desejos e das suas necessidades, que os conduzem a disseminar as suas paixões no cotidiano. Alguém um dia me disse que isto não se encontra em Hesíodo.

Das Musas Hesíodo disse:

"O que as Musas, pois, que habitam as residências do Olimpo, cantavam
as nove filhas geradas pelo grande Zeus, Clio e Euterpe e Tália e
Melpômene,
Terpsícore e Erato e Polímnia e Urânia,
e Calíope, que é a mais ilustre de todas.
Esta, efetivamente, acompanha os reis veneráveis:
aquele que as filhas do grande Zeus honram,
e quando ele nasce elas protegem-no, entre os reis nutridos por Zeus,
sobre a língua dele derramam doce orvalho,
e da boca dele fluem doces palavras; todas as pessoas
o protegem porquanto a justiça administra
com juízos imparciais; enquanto ele fala seguro de si
subitamente, também uma grande discórdia, aplaca sapientemente;
pois é para isto que os reis são sábios, porquê às pessoas
ofendidas na assembléia pagam facilmente com uma reparação,
com palavras doces acalmando-as;
quando se une à assembléia como um deus, todas o respeitam
com uma reverência cordial, e ele as utiliza entre os participantes.
Tais são as Musas, o presente sacro dado aos homens."

Hesíodo, Teogonia 75 - 93, extraído da tradução de Graziano Arrighetti ed. BUR 1999

Segundo Pausania (II° sec. D.c.) as Musas, na sua origem eram três: MELETE (Exercício, reflexão, contemplação?), MNEME (Memória) e AOIDE (Canto). E, segundo Mimnermo (VI° sec. A.c. pouco depois de Hesíodo, mesmo se a data é incerta) as Musas "mais antigas" eram filhas de Urano Estrelado enquanto as Musas "mais modernas" eram filhas de Zeus.

A dificuldade e a falta de uniformidade na interpretação das Musas, embora não tendo mitos exclusivos, indica a dificuldade dos "antigos" de interpretar o mito em si mesmo. As indicações de Mimnermo coincidem com o mecanismo das Moiras descrito por Hesíodo: filhas da Noite Negra como entes universais e filhas de Zeus para os nascidos na Natureza; filhas de Urano Estrelado para o mundo emotivo e filhas de Zeus e Mnemósine para os nascidos na Natureza. As indicações de Pausania dizem-nos que a tríade indicada é própria da manifestação de cada Musa. Além do mais, podemos dizer que as Musas são muitas e de muitos modos se manifestam conforme são as atividades do homem, no nosso caso, para difundir as paixões no mundo que normalmente vêm a ser chamadas de "arte". O elenco dos nomes que Hesíodo nos fornece é subjetivo e objetivo ao mesmo tempo.

O Ser Humano que alimenta uma Musa dentro dele para sair dos confins aonde a razão encerra a memória particular deve ser disciplinado, e praticar o INTENTO da Musa de modo impecável. Deve acumular saber e conhecimento relativos à Musa em si mesma. A tríade é a tríade mágica da Stregoneria (Bruxaria): 1) a transformação do sujeito; 2) a relação entre a prática do sujeito e o intento a ser obtido; 3) a manifestação desse Intento!

Neste caso, um sujeito humano, por meio dos seus desejos e pelas suas predileções, chama a Musa específica do seu prazer. Chama-a executando o que para a razão aquela Musa corresponde. A sua autodisciplina e a sua impecabilidade dizem à Musa chamada:

"Por qual motivo do éter, que sempre flui, evocaste-me..., assim, com obrigações que domam os DEUSES? Escuta-me, também se eu não quisesse falar, do momento que à força me acorrentaste."

Do mesmo modo é válido também para as Musas que despertam no Ser Humano, pois a ele se assemelham nos desejos e nas paixões. Proclo diz:

"Por nenhuma outra razão o DEUS dirige o homem à outra direção, e com a sua viva potência o conduz em direção a novos caminhos."

Cada Musa é "um canal de paixão" que os Seres nascidos em Hera, os Seres Humanos no nosso caso, podem percorrer para saírem da Mnemósine que Zeus recortou para o mundo da razão dela, e se unirem à Mnemósine que nos chama do Tártaro para que a alcancemos. Mover a consciência e o discernimento do "eu sou" como um sujeito que habita o mundo; à ação com a qual habito o mundo, e assim realizando, na medida em que ajo no mundo em que habito.

As mãos, as paixões e o intuir é a tríade por meio dos quais os Seres Humanos podem conseguir atingir o infinito que os cerca, ao saírem da razão. As mãos, as paixões e o intuir levam a exercitar a impecabilidade do indivíduo que chama a Musa, para sustentar o seu caminho de saída da razão. Vamos elencar as Musas denominadas por Hesíodo: Clio, Euterpe, Tália, Melpômene, Terpsícore, Erato, Polímnia, Urânia e Calíope. Qual destas Musas é a mais importante? Aquela que é praticada pelo indivíduo particularmente! Aquela que surge dentro da pessoa em particular, diferente de cada pessoa, e praticada de maneira subjetiva!

Na reprodução das paixões nas Musas, a estrutura física do indivíduo vem a ser modificada literalmente, não somente a estrutura dos neurônios se especializa na atividade da Musa específica, mas todo o seu intento e toda a sua paixão são transportados dentro da Musa, que guia a intuição que emana das profundezas do indivíduo. Praticar uma Musa significa tornar-se aquela Musa, e transformar a si mesmo conforme a linha, a direção, daquela Musa específica.

O canal da percepção que Zeus construiu com Mnemósine é um canal físico que determina a transformação do indivíduo, adaptando-o àquela Musa, com a qual ele supera as barreiras do rio do esquecimento situado nos limites do mundo da razão.

Clio

Clio é a celebração. Clio representa as histórias da vida. As histórias do infinito. As histórias da espécie. As histórias das transformações dos Sistemas Sociais. Narrar o que foi o passado para conhecer os mecanismos por meio dos quais construir o futuro. Quantas coisas foram esquecidas! Estão olvidadas, na memória dos Seres Humanos, que Zeus rematou (sua obra) com Mnemósine. As coisas não estão perdidas. Cada coisa participou na construção disto que somos. Cada coisa está dentro de nós e nos contorna. Um uivo de um lobo, uma imprecação humana, o canto de uma coruja. Nada foi perdido. Tudo é manipulação do que existe e manifestação de tudo o que existiu. Recorde e celebre! Celebre e siga as pegadas e os ensinamentos de quem construiu por meio de uma experiência e acrescente à essa experiência a sua própria experiência.

Por quê os Seres Humanos deveriam narrar as histórias da vida que já foi? Porquê deste modo manifestam os princípios sobre os quais fundam a vida que será! O passado é a fonte da experiência sobre a qual constrói-se o presente em função do futuro. Quem não tem histórias para serem contadas não tem um passado de onde pescar as experiências próprias. É como se estivesse desarmado diante da vida. Todavia, toda a história está sempre e de qualquer modo dentro dele, nas suas emoções, e nos seus mecanismos com os quais responder às solicitações do mundo. As nossas estruturas psíquica particular, emotiva, física, são o fruto de histórias de transformações da nossa espécie e da matéria. Também a nossa cultura, embora se interrompa na memória racional, tem uma história rica de experiências que podem ser pescadas.

Quem fisga do passado para construir uma cultura, com a qual faz uma experiência nova, está realizando um grande esforço de transformação. Esse esforço de transformação é o poder que lhe consente sair da Mnemósine, que Zeus construiu para os Seres Humanos, e atingir a Titânide através da qual escutar e deixar-se penetrar por todas as vozes e experiências passadas do universo.

Sair da razão por meio da análise das experiências passadas com o esforço para construir o futuro, construindo uma história lavada dos estereótipos, limpa dos chavões e da propaganda do patrão vencedor. Nós não buscamos "a verdade" na história passada, procuramos legitimar a verdade que manifestamos neste presente em função de um futuro indicado por Deméter. Zeus colocou limites à razão, mas estes foram colocados para que o Ser Humano os supere e consiga atingir o Olimpo batendo às suas portas; e Clio é um "canal de paixão" por intermédio do qual o Ser Humano individual funda o seu futuro, e da espécie à qual ele pertence. Clio é representada com um rolo de anotações em uma das mãos. Hoje podemos representá-la com um livro.

Euterpe

Um outro "canal de paixão" é Euterpe. Euterpe é a paixão gerada no Ser Humano pela música aulética. A música da flauta. Euterpe é a transformação no divino de um Ser Humano que, usando um instrumento, um objeto, que é utilizado para construir harmonia, consegue entrar em correlação com as harmonias do universo, em sintonia com as harmonias da Titânide Mnemósine. Os sons físicos têm a capacidade para atrair sons emotivos. Tratam-se de sintonias entre as vibrações do mundo e as nossas vibrações psico-emotivas, que são atraídas pelo som e ativadas por ritmos e melodias. Euterpe é a transformação do Ser Humano que permite que ele entre em sintonia com o objeto que ele toca e, posteriormente, em harmonia com os sons do universo. Se no tempo de Hesíodo esse instrumento era a flauta, nos dias de hoje os instrumentos de sons são numerosos.

A criação de Zeus consiste no fato dele ter construído o mundo da razão. Um mundo recortado em contornos do mundo do tempo que pela sua vez foi recortado de Cronos no mundo emotivo. Nesta ilha nascem e vivem os Seres da Natureza. Refere-se a uma ilha, na imensidão, construída pelo sujeito através da sua capacidade para descrever tudo o que os seus sentidos percebem. A descrição pode ampliar a ilha inteira ou apenas os promontórios ou as faixas de terra que, se ampliadas por intermédio do empenho, da autodisciplina e da impecabilidade subjetiva constroem no indivíduo as cabeças de conexão, ou seja uma ponte de comunicação em direção ao infinito. Não necessariamente um grande pianista é também um grande comandante dentro da vida social, mas seguramente a sua arte, por intermédio do seu envolvimento emocional, da sua autodisciplina e da sua impecabilidade estão em condição de plasmar a sua energia emotiva, em um nível tal que, consegue transformar a morte física em nascimento de um corpo luminoso.

A música é uma estrutura capaz de magnetizar e manipular as emoções do Ser Humano e transformá-lo. As emoções arrastam os juízos prévios. Os juízos prévios são monstros negros que a razão colocou como guardas em seus limites. Tudo o que um Ser Humano alimenta e, assim, carrega as suas emoções por meio da manipulação do seu sentimento particular e da sua percepção privada, irá abater os conceitos pré-estabelecidos que lhe impedem de elaborar novos juízos, novas reflexões, e novas descrições.

Euterpe é a Musa da música instrumental. Aquele "canal de paixão" capaz de conduzir o Ser Humano a desabrochar no infinito, mediante aquela prática e aquele modo singulares de sentir e perceber o mundo que o cerca.

Parece-me supérfluo dizer que o símbolo de Euterpe é a flauta. Que os músicos, com o exercício deles, invoquem na atividade deles e, com a autodisciplina deles, Euterpe, para que lhes conceda Energia e assim escutarem a música dos instrumentos que, no universo Mnemósine faz ressoar, no sentido da audição de todos eles!

Tália

Há duas Tálias: uma Musa e uma CÁRITE. No entanto, aqui nós nos referimos à Musa Tália. Um outro "canal de paixão" é a Musa Tália. A paixão pela vida entendida como uma comédia que deve ser interpretada sobre o palco do mundo. Uma interpretação que vincula quem executa a interpretação a tal ponto de obrigar a própria personalidade a mudar de humor e de emoção, segundo o personagem que pretende interpretar ou da situação que se predispõe a representar.

Tália é a manifestação da Loucura Controlada no Ser Humano através da qual ele afronta o mundo. Os espectadores do mundo. Reage em relação aos fenômenos percebidos que lhe chegam do mundo. Um Ser Humano que decide como deve representar-se. Quando deve representar-se. Um Ser Humano que escolhe organizar a sua aparência particular em função do alcance de um escopo em relação aos espectadores. E Tália ri! A sua comicidade é arte da representação. É a sua Loucura diante da qual o espectador nada mais faz senão rir, divertir-se: como é pateta Tália! Como é imenso o seu plano de vida; como é sério! Como o espectador é pateta: constrói o seu juízo observando Tália em vez de pescá-lo do seu coração individual! E Tália faz o espectador rir. Ao fazê-lo rir esconde a intrepidez, a determinação e a dureza do seu projeto particular.

Tália é grande "canal de paixão" que conduz o Ser Humano a disciplinar, primeiramente, e depois a sair dos limites da razão, sem que por isto se deixe perturbar pela razão. Um Ser Humano que exercitando a Loucura Controlada própria distingue entre os fenômenos que lhe chegam do mundo para incidirem sobre o seu ânimo e aqueles fenômenos, e somente aqueles, decide naquela ocasião, pelo intento que aquela ocasião exprime, de respondê-los com manifestações, atitudes, sentimentos e expansões emotivas. Ao fazer isto levanta uma barreira fazendo parar a chegada às suas emoções de todos os outros fenômenos. Não é importante se aquela ação que conclui é real ou fictícia, é importante a quantidade emocional que dedica a sua representação. É importante a disciplina que ele impõe a si mesmo ao manifestar a própria representação sobre o palco da vida.

Ao exprimir Tália o Ser Humano se arma da noção do fim que pretende atingir e dos meios com que atingi-los. Para armar-se deve manipular a sua energia vital própria. Ao manipular a própria Energia Vital constrói o próprio corpo luminoso. Constrói o próprio Ser DEUS que bate às portas do Olimpo.

Tália é representada com a máscara: a Loucura Controlada!

Melpômene

Melpômene é como Tália!

Se Tália apresenta o lado alegre e cômico com o qual oculta a determinação própria e o projeto de vida particular, Melpômene apresenta o seu desespero, a sua tragédia com o qual oculta o projeto de vida individual. Tália deixa o espectador rir; Melpômene o faz sofrer e compartilhar. Dois modos diferentes através dos quais representar a loucura controlada dos Seres Humanos. Dois modos diferentes para representar as paixões humanas com as quais esconder os projetos através dos quais afrontar a vida. Melpômene força o espectador a viver das suas paixões próprias e das suas amarguras peculiares. Força-o a ser um participante. Obriga o espectador a adaptar-se à historia que lhe é característica.

Deste modo, Melpômene constrói os planos de vida individuais! Esconde do espectador a sua força, as suas intenções, a sua força para planejar. Ao fazer isto o Ser Humano ativa um "canal de Paixão" que o leva a quebrar o círculo da razão. Enquanto corajosamente afronta o mundo ele força a sua sensibilidade pessoal, as suas emoções particulares, para exprimir uma tristeza infinita que acaba arrastando o espectador tornando-o cego e desarmado diante da ação das mãos do ator. As finalidades para que nos transformemos em Melpômene ou em Tália são iguais. As diferenças são exclusivas do sujeito que consegue representar aquela determinada parte sobre o palco da vida. Existem pessoas que são capazes de fazer rir ao ponto de levar às lágrimas enquanto estão construindo seriamente os planos delas, no ataque ao céu do conhecimento e da aprendizagem; ao passo que existem pessoas que preferem fazer chorar com histórias comoventes e dolorosas à medida que o coração delas, volúvel, afronta os desafios da existência.

O que resta ao espectador?

Resta o transformar-se em ator da sua própria vida. Resta a possibilidade de livrar-se de ser um objeto de armadilha do ator, ou ser o sujeito que impede os Seres da sua própria espécie de penetrarem o céu do conhecimento e da aprendizagem. Resta-lhe ser sempre igual a si mesmo! Resta o seu rir pela paixão de Tália ou o chorar pela paixão de Melpômene e, ao fazê-lo, pode dar um vigor novo à sua própria energia a fim de que se aperfeiçoe, se organize e se predisponha a enfrentar o infinito.

Tália e Melpômene, consideradas juntas, é como se fossem o mesmo "canal de paixão" que se manifesta de modo igual, com técnicas iguais, com organizações subjetivas iguais, mas com um envolvimento emocional diferente.

Desse modo consideraremos as duas Musas. Elas são representadas com uma máscara. Uma com uma máscara que ri e a outra com uma máscara trágica. Ambas, de qualquer modo, representam a comédia no palco da VIDA!

Terpsícore

Terpsícore é o dançar.

Tentem a aprendizagem da dança. Representar o universo através do fluir dos movimentos. Tentem viver a transformação subjetiva concedida por ela. O uso da Atenção que ela envolve. A manipulação da subjetividade particular por meio da qual devem circular as descrições da vida, dos sentimentos, das emoções que chegam do mundo ao sujeito que dança, e como este retransmite-os ao mundo que o observa. Dançar significa representar. Representar aqueles fenômenos e aquelas tensões, que incidiram no sentimento individual, e assim trespassando a própria atenção.

O indivíduo que dança manipula a si mesmo.

No início há uma manipulação física do corpo, mas gradativamente, quando esta manipulação progride, então não somente os músculos são modificados para dirigirem os movimentos, mas também as conexões dos neurônios para transferirem a linguagem do corpo e, portanto, permitirem à estrutura emotiva mostrar-se nos movimentos. Os grandes bailarinos são aqueles que transmitem emoções, sensualidade, vínculos, vontade, determinação à cada espectador. O controle do sentimento do dançarino será somente dele, como apenas e tão-somente será dele a representação do mundo, porém ele é quem transmite essa representação. Ele usa aquilo que sente e constrói uma representação, que doa aos Seres da sua própria espécie. Não é o perceber que gira em vão na vida, mas é a percepção que vem a ser representada através da manipulação da subjetividade do ator.

É Terpsícore que se transmite aos Seres Humanos, por meio da dança. Exatamente porquê o Ser Humano torna-se Terpsícore é que ele consegue sair dos limites angustiantes da razão. Ele, dançando, apresenta aquilo que ele percebe na razão, satura a razão com a sua ação e, a razão impotente com a sua ação é obrigada a deixar entrar sensações novas e novas emoções que vêm do desconhecido que está ao nosso redor. Assim, o sujeito que dança apresenta, aos Seres Humanos, sentimentos e sensações que eles, por não conseguirem sair dos confins da razão, não conhecem. Ao representar Terpsícore o Ser Humano dança a vida. Manipula a sua Energia Vital, as suas emoções e se apresenta diante da morte do corpo físico com um corpo luminoso forjado pelas danças infinitas, às quais obrigou-se a executá-las.

Apresenta-se com a força das emoções infinitas que percebeu, assimilou-as e descreveu-as. Ele construiu a si mesmo no infinito!

Erato

Erato é um canal de paixão através do qual se manifesta "desejo belo". AFRODITE. É o canto harmonioso, a paixão do amor, e o arrastar-se pelas emoções que atravessam os Seres germinados em Hera. Quando as paixões amorosas impelem os Seres, cada regra, cada tabu imposto pela razão, tomba! Remexe-se a Energia Vital e os confins impostos pela razão são superados. Novos fenômenos, novos juízos formam-se nos Seres Humanos, tudo se altera: a própria razão.

Os Deuses Titãs organizaram, colocaram as bases na fundação do universo, e Zeus gera os canais de paixão aos filhos de Hera para que não permaneçam prisioneiros de limites tristes e cinzentos. Através desses canais de paixão os filhos de Hera podem movimentar os seus passos e a paixão amorosa é baixada, de um modo tão profundo nos Seres da Natureza, que representa a atividade primaria nas quais se enxertam todas as outras paixões.

Erato é o canto do amor.

O canto de paixão de cada Ser que se funde com a vida. Erato vive desta paixão; Erato é esta paixão; Erato alimenta esta paixão.

Quando os cristãos proibiram a dança, a música, as tragédias e as comédias, Erato alimentava com cantos as paixões dos Seres Humanos. Erato é uma Musa que está ao lado de Afrodite. Afrodite nasceu de Urano Estrelado, portanto com as Eríneas, sendo pura emoção como base de todo o existente. De qualquer modo Erato sussurra ao coração dos Seres Humanos a sua canção de amor! Sempre!

Através deste "canal de paixão" os Deuses chamaram os Seres Humanos para se desvencilharem da submissão à qual os cristãos os obrigaram. Através do canto do amor acompanharam os Seres Humanos quando a caminhada era dura debaixo do despotismo dos ferros em brasa dos católicos; os Deuses alimentaram as paixões e os interesses para que permanecesse vivo o desejo pela vida. Depois, aos poucos, o canto de paixão de Erato se ergueu. Do murmúrio débil do desejo tornou-se um som imperioso do Amor envolvente, é a Paixão que compele cada hesitação e varre os constrangimentos impostos pela moral de morte que, os condutores de ovelhas, que conduzem ao matadouro essas ovelhas, impuseram.

Diversas são as máscaras com que Erato se apresenta; diferentes são os enganos e várias são as Loucuras Controladas com que Erato se manifesta! Só que os seus enganos são doces e suaves; eles são ciladas do amor e da paixão com os quais ata os Seres Humanos para que construam as suas vidas no infinito!

Polímnia

Polímnia é um "canal de paixão" muito unido ao Ser Humano. Polímnia exprime as paixões com a retórica e a mímica. Palavras e mímica que necessitam igualmente de disciplina para tocar-se um instrumento, para a dança, mediante os quais se manifestam sentimentos, sensações e emoções. Palavras que incentivam, palavras que ofendem, palavras que atraem, palavras que fascinam! Gestos! Gestos de oferecimento, gestos de raiva, gestos afáveis e gestos de paixão.

Parece quase normal Polímnia englobada nas ações dos Seres Humanos, no franzir da fronte, ou no sacolejar pelo riso incontrolável. Paixões que são demonstradas pelos gestos, paixão manifestada com palavras proferidas diante de um auditório que deve ser atraído, impressionado, levado à apaixonar-se ou levado à indignação e à raiva!

A arte da retórica, a arte para expor os gestos e as palavras. Uma arte para ser praticada e poder transformar-se, mas como usá-los diz respeito somente a cada um pelo modo como cada um habita o mundo, compete somente a ti.

A retórica transforma-se num sofismo vazio por meio do qual esconder o real por intermédio da aparência. Para a retórica ser usada é necessário ser permeado pela retórica; praticar a retórica impregnando-a com as emoções particulares. Para fazer isto, para obter este resultado, necessário se faz estar sensibilizado. Aqui não se trata da Loura Controlada de Tália nem a de Melpômene; trata-se de uma pequena "pedra" que colocada em ação provoca uma avalanche. Tália e Melpômene ocultam do espectador o intento. O ator cria o engano para que o intento particular dele seja alcançado. Neste caso refere-se à representação sobre o palco da vida. Com Tália e Melpômene o espectador ri e chora, se diverte e se comove, mas permanece como um espectador acolá da representação do ator. O ator mantem-se distante do espectador: eu sou aquele que age! O espectador só assiste. O espectador pode concordar ou discordar, porém é um sujeito passivo.

Polímnia não separa os Seres em ativos e passivos, mas entre aqueles que a manifestam e aqueles que ainda não a manifestaram, e portanto deve ser chamado a manifestá-la. A arte de Polímnia é aquela que coloca o movimento nos Seres Humanos. "Às armas, defendamos a pátria!" E assim em diante. Existe uma Polímnia que percebe as emoções do mundo transmitindo-as e acordando a Polímnia em cada Ser que assiste a sua representação. Para mim não é prazeroso pensar na manifestação de uma Polímnia num tribunal, que tem a finalidade de obter a condenação de um indivíduo a quem se imputa um crime específico que foi cometido. O crime ou é comprovado ou não é comprovado; a eloquência voltada a deprimir ou a limitar as escolhas dos Seres Humanos é um retórica vazia, é a manifestação da pulsão de morte imposta pelos cristãos e desdobrada a todos os tipos religiosos de monoteísmo. Prefiro ver Polímnia na eloquência de um magistrado ou de um advogado enquanto demonstra aos jurados a necessidade de exaltar Eunômia. Porquê somente Eunômia pode ser a guardiã da construção do bem-estar social!

O homem da sociedade se comunica com as palavras. As suas palavras são a retórica com que tenta descrever emoções ou mecanismos da vida, e Polímnia é o divino que se manifesta com essas palavras. Quantas emoções estão em condições de serem expressadas por meio da arte da retórica? Desde há muito tempo, não sei porquê, com frequência, a arte da retórica transformou-se na arte do engano, vazia de sentido e privada de conteúdos.

A pergunta que me faço no que se refere à Polímnia é esta: um político que usa a retórica, nestes nossos dias, tem gabarito de completar a sua retórica concorde com as paixões emotivas e com aquilo que deseja, em um tempo de transformações, e em um suficiente número de vezes para manipular a sua estrutura emotiva pessoal e, assim, construir o seu corpo luminoso, moldando a sua estrutura emotiva individual, por intermédio da retórica?

Urânia

Como é prazeroso olhar o céu estrelado; quantas emoções! O céu estrelado está apto para dar ao Ser Humano a percepção do infinito onde está imerso.

Que grande "canal de paixão" é Urânia. Nascida de Zeus e baixada nos Seres Humanos para que não percam o contato com o infinito em que estão imersos: Urano Estrelado. Quantas noites os Seres Humanos passaram admirando o mundo acima das suas cabeças. Um mundo sempre diversificado que descreveram e povoaram com Seres fantásticos. A fantasia dos Seres Humanos tentou colocar ordem num infinito no qual o sentimento e as emoções se perdem. Para a "sorte" dos Seres Humanos a razão recortou o espaço da descrição, se fosse de outro modo o Ser Humano teria perseguido cada voz e cada sussurro que dessa imensidão se uniriam a ele sem a possibilidade de disciplinar o seu escutar específico. Sem a possibilidade para construir a sua existência própria!

"Sorte"? Não! Necessidade! O Ser Humano veio a ser deste modo porquê aquelas eram as condições, e Zeus podia acomodar essas condições no complexo em que existia.

Os Seres da Natureza estão separados do infinito por meio dos limites da descrição racional que Zeus colocou, para que possam edificar a Autoconsciência particular. Ao mesmo tempo, os Seres da Natureza são atores no infinito, ligados a um "canal de Paixão", que lhes permite almejar a Liberdade entendida como movimento em espaços sem limites.

Urânia é um sussurro da imensidão. Uma imensidão na qual Seres Humanos estão mergulhados tentando colocar ordem. Descrevendo e relacionando, mas sempre fizeram perambular nessa imensidão as suas fantasias. Sempre nessa imensidão refugiavam-se com os seus desejos, e quando esses desejos tomavam forma estavam sempre impregnados pelo Poder da imensidão, que alimentava o sentir e a determinação dos Seres que aspiravam a essa imensidão. O infinito que sustenta a si mesmo alimentando as tensões de cada Ser que se encaminha a esse infinito!

Urano Estrelado, primeiramente afastado de Cronos, através da transformação e a mudança das Autoconsciências, e posteriormente por Zeus através da formação da "razão" na qual as Autoconsciências, nascidas em Hera, se constroem, é representada a cada Autoconsciência revelando-se nas necessidades e nos desejos.

Urânia é o "canal de paixão" que estimula o sentir e o intuir dos Seres Humanos levando-os a interagirem com o imenso Urano Estrelado.

Calíope

Acerca de Calíope Hesíodo expõe: "e Calíope, que é a mais ilustre de todas!"

A Musa que externo é a mais importante de todas enquanto eu a manifesto. Se eu externasse uma outra diferente ou diferentes Musas, então estas seriam as mais importantes. Assim são porquê através daquele determinado canal de paixão construo o meu caminho no infinito. Outros caminhos, outros "canais de paixão" são desconhecidos por mim. Não os conheço, não os alimento, sou ignorado por eles! É mais ilustre porquê é aquela que está se manifestando através do meu operar, isto é do meu agir, e da minha existência.

Quantas proezas e quantas histórias Calíope narra. Histórias épicas nas quais os Seres Humanos invadiram o céu do conhecimento e da sabedoria. Grandes Heróis e Grandes Deuses alimentaram Calíope que, tutelando-lhes as proezas, demonstrou-lhes manter um "canal de paixão" vivo e atento na razão do Ser Humano e na monotonia da vida à qual rotineiramente é obrigado a estar. Evidentemente levanto-me pela manhã para trabalhar, mas Hércules executou os seus trabalhos e tornou-se um DEUS. Evidentemente observo as mãos maltratadas pelo trabalho ou a monotonia no cotidiano, mas Cronos decepou os genitais de Urano Estrelado e Zeus abateu Cronos e lutou contra os Titãs. Indubitavelmente é duro cavar a terra, mas de um terreno deixado em repouso para novamente ser fértil, arado três vezes, Deméter com Iasião gerou Pluto, a predisposição à riqueza e ao bem-estar. Conforme Deméter introduziu Demofonte no fogo, para torná-lo eterno, assim também instruo os meus filhos para se apropriarem dos instrumentos para, com estes, enfrentarem a vida corajosamente, e tornarem-se eternos.

Em cada uma das histórias que Calíope recorda e conta lá estou eu.

Há cada Ser Humano que as escuta. Há a sua identificação com o herói. Há o seu sonho para o salto no infinito. O seu sonho para sair do cotidiano. O seu sonho de eternidade!

E cada um pensa nas estratégias. Alguém pensa nos seus relacionamentos com o quotidiano e os sonhos tornam-se parte da realidade. O herói acorda dentro do Ser Humano. A Bruxa (la Strega) voa sobre a sua vassoura e o Ser Terra começa a florir! Toda a vida passa a florescer quando os Seres Humanos se transformam em heróis segurando em suas próprias mãos a responsabilidade da própria vida, e assim começam a invadir o céu do conhecimento e da sabedoria.

Calíope é, portanto, um grande "canal de paixão" capaz de conduzir os Seres Humanos para fora do jugo da razão e da submissão no cotidiano. As histórias que estamos lendo e que eu estou interpretando por meio da arte da BRUXARIA (STREGONERIA) é o presente que Calíope deu aos Seres Humanos para que se recordem e forneçam a si mesmos os instrumentos para saírem da submissão.

Os adoradores do carniceiro de Sodoma e Gomorra não conhecem os "canais de paixão", pois eles têm medo deles, desses canais eles têm terror e horror. Mas, o coração dos Seres Humanos ama quando eles escutam histórias de Seres Humanos que cortaram os arames farpados dos campos de extermínios, inclusive os que não procederão da mesma maneira para cortarem os seus arames farpados; só pelo fato de saberem que alguns cortaram os seus, sabem que esse ato permite pensar que, talvez, também muitos de nós possam cortá-los e que, não necessariamente acabaremos nas câmeras de gás da submissão imposta pelos adoradores do sanguinário contra Sodoma e Gomorra!

CONCLUINDO

As Musas são as Autoconsciências que geradas por Zeus mantêm aberta a comunicação entre a razão dos Seres, que a estes limita dentro dela, e o infinito circunstante. Viver as Musas (e outras Musas que não conhecemos) consente aos Seres nascidos de Zeus e Hera percorrerem o caminho nobre onde o corpo luminoso é construído, e no final desse caminho baterem às portas do Olimpo para reivindicarem o reconhecimento particular de que são Deuses.

As Musas acompanham os Seres da Natureza e a nós, Seres Humanos. Cada espécie, filha de Hera, constrói a si mesma por meio da manifestação das Musas. A beleza, o canto, a dança, as emoções, enfim, alimentam as sensações por intermédio das quais percebemos o mundo deixando-nos arrastar pelo mundo e assim vivermos tudo o que nele existe. Estas forças, por um lado enriquecem o discernimento de todos os Seres que concluem a existência específica fundindo-se em Hera; e por outro lado alimentam os Seres que, em seus caminhos no infinitos, estão capacitados para assimilarem a Liberdade.

Os Seres Humanos devem ter um número infinito de desempenhos apaixonados na vida do dia a dia para construírem e alimentarem a Liberdade no infinito, mas as Musas constituem grandes possibilidades para que um caminho, no infinito, seja transitado inclusive quando cada uma das portas, que se seguem umas às outras, tenham grades.

*NOTA*: As citações da Teogonia de Hesíodo são extraídas da tradução de Ettore Romagnoli "Hesíodo os poemas" Edição de Nicola Zanichelli Bolonha 1929

*Nota*: Nesta página foi usada também Hesíodo, Teogonia, Trad. Graziano Arrighetti ed. BUR 1999

Nota através da transmissão radiofônica no ano 2000 - início da revisão em 18 de setembro de 2014

Revisão

Marghera, 10 de novembro de 2014

A tradução foi publicada 1 de abril de 2016

Aqui você pode encontrar a versão original em italiano

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Claudio Simeoni

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A análise da Teogonia de Hesíodo

A Religião Pagã forjou uma visão própria do mundo, da vida e do vir a ser das consciências desde as origens do tempo. Tais ideias coincidem no tempo presente com as ideias das religiões e dos primeiros cultos antes da chegada da filosofia, e foram hostilizadas militarmente pelo ódio cristão contra a vida. Analisar Hesíodo nos permite clarificar o ponto de vista da Religião Pagã.